Da Veja – 04/08/2013
Quinta-feira, 20h40, correria na
Avenida Paulista. Cercados por uma barreira de policiais por todos os lados,
dezenas de jovens com o rosto coberto e roupas pretas partem em direção à
drogaria Onofre, na esquina com a Rua Bela Cintra. Conseguem abrir distância do
cordão de policiais, tentam atacar a farmácia, mas um grupamento da Polícia
Militar os impede. Os arruaceiros recuam ante os golpes de cassetete e começa
um confronto. Dois morteiros são jogados em meio ao caos. Seis pessoas são
algemadas e levadas pelos policiais até a viatura da Força Tática.
Todos os seis, entre eles dois
menores, foram detidos e passaram a madrugada da última sexta-feira nas celas
do 78º DP, nos Jardins. Foram enquadrados por lesão corporal, resistência à
prisão e favorecimento. Além deles, outros sete foram detidos pela PM por volta
das 23 horas depois que a passeata dispersou na noite de quinta-feira. Eles
foram acusados de dano qualificado, pichação e ato infracional. Segundo a PM,
uma denúncia chegou por ligação telefônica: os vândalos estariam depredando
três agências bancárias na Rua Augusta e destruindo seis caixas eletrônicos.
Com o grupo, a PM apreendeu uma marreta de borracha, sprays, barras de ferro e
objetos usados em depredação, máscaras contra gás lacrimogêneo e óculos de
segurança. Na manhã desta sexta, os treze foram liberados. Só será aberto
inquérito se os bancos apresentarem queixa da depredação.
O grupo de anarquistas mascarados
que tem vandalizado a capital paulista se autodenomina “Black Bloc” e começou a
agir à margem da onda de protestos que sacudiu o país em junho. Quando as
passeatas perderam fôlego, passou a organizar seus próprios quebra-quebras
pelas redes sociais. No Facebook, é possível encontrar páginas dos anarquistas
de preto agendando mobilizações em São Paulo, no Rio de Janeiro e nas
principais capitais do país. Em geral, os padrões são idênticos e terminam com
um rastro de destruição de estabelecimentos comerciais e do patrimônio público.
Os mascarados bradam contra os governadores de São Paulo, Geraldo Alckmin
(PSDB), e do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB). Também cobram informação
sobre o desaparecimento do pedreiro Amarildo de Souza, na Favela da Rocinha, no
Rio.
Perfil - Apesar da presença de
menores de idade, a ampla maioria dos encapuzados é composta por jovens na
faixa dos 20 anos, estudantes universitários de cursos como História e Ciências
Sociais - da pública USP às particulares PUC, FMU e FAAP. São brancos e de
classe média, com alguma familiaridade com pensadores da esquerda política - a
lista de detidos inclui um professor universitário. Usam calças e casacos
pretos. A indumentária também inclui lenços no rosto, mochilas nas costas e
tênis, embora alguns prefiram um calçado mais forte: “Cara, estou sem meu
coturno hoje”, disse um manifestante em tom de preocupação, na noite de
quinta-feira.
Nesta quinta, horas antes do
grupo se reunir em frente à prefeitura paulistana para um novo ato, o
Ministério Público se manifestou a favor da libertação de cinco manifestantes
que seguiam detidos após o protesto de terça-feira. Eles foram soltos nesta
sexta, por determinação da Justiça. Na ocasião, as câmeras de TVs flagraram cenas
lamentáveis de violência explícita, com o apedrejamento de agências bancárias,
viaturas da Polícia Militar e uma concessionária de carros na Avenida Rebouças
– um modelo branco foi pichado um símbolo anarquista. Ao defender a liberação,
ocorrida nesta sexta, os promotores endossaram a defesa dos advogados, segundo
quem os detidos não se conheciam e agiram autonomamente - a intenção é evitar a
acusação de formação de quadrilha. "Há vídeos mostrando que estavam
sozinhos, sem praticar vandalismo, quando foram presos", disse o advogado
dos detidos, Luis Guilherme Ferreira ao jornal O Estado de S.Paulo.
A PM enquadrou os baderneiros por
dano qualificado contra uma viatura, desacato à autoridade, resistência à
prisão e formação de quadrilha. Na ocasião, foram detidos o publicitário e
artista plástico Thiago Frias, de 31 anos; os estudantes Francisco de Campos
Lopes e Nicolas Gomes de Deus, ambos de 20; Bruno Torres Mendes Soares e a
estudante Andresa Macedo dos Santos, ambos de 19. Os quatro primeiros passaram três
dias no Centro de Detenção Provisória de Pinheiros. Andresa, no CDP de Franco
da Rocha.
Tática - O termo "black
bloc" (bloco negro, em inglês) se refere a uma tática de promover atos de
vandalismo e depois se misturar à multidão, empurrando a massa para
comportamentos similares. O método foi usado na década de 1990 por anarquistas
europeus - surgiu na Alemanha nos anos 1970 e foi replicado em outros países.
Em sua página no Facebook, o "Black Bloc SP" usa uma citação do
ativista anarquista italiano Errico Malatesta e ataca políticos.
O grupo líder forma uma linha com
cerca de quinze pessoas, braços entrecruzados, que marcham à frente das faixas
de protesto. Para se agrupar, a palavra de ordem é: “Bloco!”. Pelo menos cinco
dos líderes dão o tom dos gritos de ordem e definem o itinerário a ser seguido.
A comunicação é feita por gestos.
“Não temos um coletivo organizado
por trás, por isso ainda cometemos erros, nos dispersamos muito, mas vamos
aprendendo na rua, na prática”, disse na quinta-feira um rapaz que afirmou ser
anarquista há “alguns anos”, mas não quis se identificar.
O grupo de anarquistas de preto
que saiu às ruas da capital paulista nas últimas semanas é significativamente
menor que as multidões de junho. Mais: se as passeatas que reuniram milhares
ainda são um caso a ser estudado na história recente do país, os atos
promovidos pelo "Black Bloc" se configuram em um caso - cada vez mais
claro - de polícia.
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