Da Folha – 01/09/2013
Por meio da Lei Rouanet, agora
questionada por incluir incentivos a desfiles de moda, dinheiro público já é
destinado a projetos de reforma de igrejas, pontes, sedes de governo, uma
Oktoberfest e até torcida organizada.
É algo comum na tributação: em
todo lugar, leis que facultam ao Estado aprovar projetos de desoneração fiscal
criam fila de interessados, e a porteira vai se abrindo.
Ao todo, a Rouanet já reduz a
arrecadação pública em R$ 1,2 bilhão ao ano. Em comparação, em 2012 todas as
universidades federais, juntas, receberam R$ 2 bilhões.
Se o objetivo da lei, de 1991,
era mobilizar a iniciativa privada, reduzindo a dependência da cultura às
canetadas de Brasília, houve certo fracasso. Veja as quatro empresas que mais a
utilizam: Petrobras, Vale, Banco do Brasil e BNDES.
O mercado aparece mais na ponta
da captação. As campeãs são fundações vinculadas a grandes empresas - Itaú
Cultural e Fundação Roberto Marinho, ligada às Organizações Globo. O terceiro
lugar é da Time for Fun. Em 2012, teve autorização para captar R$ 28 milhões
para espetáculos como "O Rei Leão" e "A Família Addams",
cujos ingressos chegam a R$ 280.
Daí surge uma das maiores
críticas à lei: ela seria um "Robin Hood às avessas", tirando dos
serviços públicos para bancar eventos caros.
O próprio secretário de Fomento
do Ministério da Cultura, Henilton Menezes, em apresentação a empresários
gaúchos em maio, criticou isso: "O acesso das classes C, D e E é baixo, [a
lei] não estimula o investimento de recursos privados no setor, e a prestação
de contas é inadequada".
Pela lei, em geral não há
contrapartida das empresas - o incentivo é totalmente deduzido do Imposto de
Renda.
Mesmo eventos mais baratos, de
nicho, podem ser vistos como elitizados - em 2012, a lei apoiou nada menos que
29 eventos de jazz. E há forte concentração no Sudeste: 81% dos gastos.
CULTURA
Há muito mais, porém, sob o
guarda-chuva da Lei Rouanet do que musicais e jazz.
No relatório dos incentivos de
2012, consta que a Fundação Catarinense de Cultura, ligada ao governo do
Estado, conseguiu autorização para captar R$ 64 milhões para reformar a ponte
Hercílio Luz, em Florianópolis, com recursos de desoneração fiscal.
Pernambuco e Rio de Janeiro, por
sua vez, aprovaram a captação de R$ 20 milhões e R$ 12 milhões para reformar os
palácios do Campo das Princesas e das Laranjeiras.
A arquidiocese de Campinas
aprovou R$ 7 milhões para reformar sua catedral. Para a de Brasília, foram R$
25 milhões. Em São Paulo, as igrejas da Santa Ifigênia e de Santo Amaro tiveram
juntas aprovação de R$ 9 milhões.
Houve ainda projetos aprovados de
obras em igrejas em Curitiba, Goiana (PE), Pelotas (RS) e Porto Alegre, entre
outras, em mais de R$ 26 milhões. A Oktoberfest de Igrejinha, no Rio Grande do
Sul, pôde captar R$ 653 mil.
Até a Mancha Verde, torcida
organizada do Palmeiras, teve R$ 1,2 milhão aprovado para organizar seu
Carnaval.
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